sexta-feira, setembro 28, 2012

DEUS SABE QUE NINGUÉM TEM...


Deus sabe que ninguém tem 

instrumento igual ao meu: 

venham medi-lo e hão-de ver 

o tesouro que EI’ me deu.
Tomai-o – isso! – na mão: 

é meu timbre de valor.
Quem o gosto lhe descobre 

sucumbe de terno ardor.
Tão alto como um pilar 

(como um pilar não encolhe) 

visto ao longe na distância 

de qualquer lado que se olhe.
Venham pegar, e apertá-lo 

com força na vossa mão.

E levai-o à vossa tenda,

entre onde os montes estão.
Sê-de vós a lá guardá-lo 

com vossa mão cuidadosa. 

Vê de quanto ergue a cabeça 

como bandeira orgulhosa!
Nem dareis por sua entrada, 

tão corajoso ele avança!
Jamais pende como a vela 

quando o vento se descansa.
Que el’ seja asa da panela 

entre as pernas escondida, 

tão vazia desde o fundo 

até à borda cingida.
Venham ver a maravilha

que logo se ergue tão pronta! 

Tão rara e tão portentosa, 

tão rica de bens sem conta!
E vejam como endurece 

tão forte e tão magistral: 

É coluna dura e longa 

de uma força sem igual.
Se quereis pega segura,

ou colher que bem remexa, 

outra melhor não tereis 

para panelas sem queixa.
Pegai nesta – que ela esteja

na vossa panela ardente, 

lá onde só um instrumento 

haverá que vos contente!
Nem sonhais – amores – o gosto 

que vos dará tal espada,

mesmo em panela de cobre 

ou de prata chapeada.

ABU NOVAS

terça-feira, setembro 25, 2012

Delírio

Nua, mas para o amor não cabe o pejo
Na minha a sua boca eu comprimia.
E, em frêmitos carnais, ela dizia:
– Mais abaixo, meu bem, quero o teu beijo!

Na inconsciência bruta do meu desejo
Fremente, a minha boca obedecia,
E os seus seios, tão rígidos mordia,
Fazendo-a arrepiar em doce arpejo.

Em suspiros de gozos infinitos
Disse-me ela, ainda quase em grito:
– Mais abaixo, meu bem! – num frenesi.

No seu ventre pousei a minha boca,
– Mais abaixo, meu bem! – disse ela, louca,
Moralistas, perdoai! Obedeci...


Olavo Bilac

segunda-feira, setembro 10, 2012

MOMENTOS


Não me apetece dizer o que penso,
o que sinto, o que sou.
Não me apetece dizer-te
para onde vou, onde estou
o que senti.


Não me apetece manifestar meus afectos,
meus carinhos, pedir um beijo,
roçar teu corpo em mil desejos ...


Não me apetece dizer
quantos orgasmos tive,
quando me possuías loucamente.


Não me apetece dizer o que sinto
quando o frenesim da tua boca
roça as minhas coxas
e me deixas louca de tesão.


Não me apetece!
E apetece-me tudo ... 


Otília Martel

segunda-feira, setembro 03, 2012

UMA MENINA




água, tua música de pele
e cheiro fluindo de florações
impalpáveis, chuva acesa
no centro do abismo, onde flutuam
manhãs

terra, teus passos tua voz teus
ruídos de amor e um gozo
além das cordilheiras do sonho
tecendo galáxias, vertiginosa
raiz

ar, teu gesto marinho, olhos
feitos do arremesso do mar
e a centelha invisível a mover
os labirintos do vento, cósmica
serpente

fogo, teu corpo de medusas
e feridas vivas, vulcões,
planeta todo luz, talvez paixão,
pássaro tatuado nas estrelas,
coração

Afonso Henriques Neto