segunda-feira, julho 31, 2006

Prontos e mai nada!

Faltas-me
Como os euros na carteira
Como a água na torneira
Em dia de corte geral.
Apeteces-me
Como me apetece um gelado
Como me apetece uma Seven-Up
Ou um bom arroz de marisco.
Sei-te
De cor e salteado
De trás, de frente e dos lados
Sei-te de todas as maneiras.
Gosto-te
Porque sim
Porque me apeteces
Porque me sabes como ninguém
Porque sei o que me faz bem.
Gosto-te prontos.
E mai nada!

Encandescente

sexta-feira, julho 21, 2006

O tempo que em mim fazes

Os beijos, sempre os beijos
trazem serenas cores, que sossegam
o meu corpo. A tua voz,
a repetida surpresa do encontro.



Os nossos corpos ajustam-se
ao inesperado arco-iris do desejo.
Aconchego-me no teu colo,
e sou, uma doce e inebriante tarde de verão.



Quando me deixas,
Invade-me a mansidão da rosa perfumada,
suavemente colhida.



A noite, pressinto-a já,
nos teus passos,
no gesto rápido quando te despes,
nos frutos
que comemos ao cair da tarde.




Este é para mim mesmo sem autorização do autor....

segunda-feira, julho 17, 2006

Tudo é substituído...

Quando crestando o céu
a noite se espalha,
tudo é substituído...

o sol verde das folhas pela paúra dos troncos,
o barulho das borboletas pelo silêncio dos uivos,
o trabalho pelo sexo,
a sombra pelo vulto,
a dor pelo sono. Cai
a cor do chão, laminada sob a lua.

Mas o mar, não.
Tudo é substituído menos
o mar que morre.

Que deixa o nada desenhado
entre a espuma e a espátula
do horizonte:
o aposento de um filho perdido
é seu lugar vazio deitado na noite...

segunda-feira, julho 10, 2006

Um único corpo

O calor soltou
A floresta nua
Já não há floresta
Nem passeios à tona d'água
Nem sombra leve sobre os rins
O céu tornou-se-nos um fardo

O nosso corpo é uma presa
Vestida de maduras lágrimas
Os dedos são pregos sangrentos
Os seios giram sobre si próprios
A boca só tem irmãs

Deixou de haver janelas para abrir
Já não há paisagem
Nem ar puro nem impuro
Os nossos olhos voltam à sua nascente
Sob a carne nua da sua beleza natal

Paul Éluard

quarta-feira, julho 05, 2006

Quero uma vida em forma de espinha

Quero uma vida em forma de espinha
Num prato azul
Quero uma vida em forma de coisa
No fundo dum sítio sozinho
Quero uma vida em forma de areia nas minhas mãos
Em forma de pão verde ou de cântara
Em forma de sapata mole
Em forma de tanglomanglo
De limpa-chaminés ou de lilás
De terra cheia de calhaus
De cabeleireiro selvagem ou de édredon louco
Quero uma vida em forma de ti
E tenho-a mas ainda não é bastante
Eu nunca estou contente


BORIS VIAN

......para a minha tigresa....