quarta-feira, maio 31, 2006

Fernando Pessoa

XVIII
Iô! Iô! Escorre um suco de raiva e prazer
Por entre os corpos em mescla enredados
Que ardem por despir-se e guerra fazer
Sobre a carne uns dos outros, dados
Na luta que enche o ventre p’ra leite deixar
Nas tetas que um homem souber conquistar,
Combate em raiva de ajustar, unir,
E não de magoar ou de se ferir!
Iô! Iô! Embriagai-vos com o dia e a hora!
Gritai, gargalhai, esmagai agora
O próprio pensar em clamor e verdade,
Não escape uma queixa de morte ou idade!
Tudo juventude agora e as pequenas
Dores, que vibram nas veias plenas,
São elas cheias de prazer excitado
Para suspender antes de saciado.
Tudo, excepto a carne, da mente tirai,
E o dar do leite macho que faz viver!
Repiques de alegria, como erva arrancai
Do chão da alma onde veio crescer!
Fazei o vosso cio imenso jubilar
Com soltas risadas e vosso falar,
Como se a terra, o céu em brasa, o ar tremente
Soassem qual címbalo, poderosamente!

Poesia Inglesa I(tradução de Luísa Freire)

terça-feira, maio 30, 2006

Pedido

Larga tudo
e vem me espasmar
É teu direito
e seja o meu também
Serei tua ré
não tenha complacência
e na demência
nos percamos tontos

É meu dever
perder todos os pontos
calar tua boca
à minha, sem clemência
beijar-te as pernas
grossas, entre elas
brincar de línguas
em rodamoinhos
ouvir o arfar
balouços de carinhos

É meu dever
ser tua ré-confessa
É meu dever
me dar-te às avessas

Vem se enroscar!
Penetre no meu rio
saudoso
caudaloso
cio

Vem se espelhar!
Penetre neste olhar
a te espasmar
vem me espasmar

Isabel Machado

segunda-feira, maio 29, 2006

Anespirais

espirais cobrem meu corpo
despencam helicoidais
ideogramas/nanquim/pincéis
tatuagens
não breves sinais

rufar de tambores
febre cerebral/enxaquecas
furor
humor e tumor
dores fatais

não sei quanto tempo
sentado na praça
contando cachaça
bebendo desgraça

sem você
sou vazio e sem cenho
criança sem colo da mãe

me lembro quando amar
não doía
pérola na língua
vermelho carmim

agora carrego um olhar flutuante
choro lendo hai-kais

chuva sobre bambuais

tensão de garoa
uma lata vazia flutua no ar

um dia ouvi alguém que esqueci
sussurrou

em japonês
amor
se diz "ai"

Edson Bueno de Camargo

quinta-feira, maio 25, 2006

Estás




estás nas manhãs remelosas. nas noites de insónia. nos discos
em auto-repeat. nas imagens que invento. nas palavras que
junto sem sentido. nos filmes de amor trágico. nos livros
que falam de coisas sérias. nas manchetes sangrentas dos
tabelóides. na chávena de leite achocolatado. no ronronar
do gato que se deita a meu lado. no relato da partida de
futebol no canal codificado. em mais um cigarro que
sorvo. e ainda no fastio a que me obrigo. no chão da sala
polvilhado de sapatos. nas folhas de papel riscadas.
foda-se. estás em tudo. em todas as coisas. em todos os sentidos
que confundo. em cada sonho. em cada pesadelo com a
morte. nas fugas. nas corridas infundadas contra o tempo.
em mim. apenas em mim insistes em estar.
longe

quarta-feira, maio 24, 2006

Smgarakarika Kumaradadatta




Seu hálito é como mel aromatizado com cravo;
Sua boca, deliciosa como uma manga madura.
Beijar sua pela é como experimentar o lótuz.
A cavidade do seu umbigo oculta uma profusão
de especiarias.
Que prazer repousar depois, a língua sabe,
mas não pode dizer.

(Século XII)

Smgarakarika Kumaradadatta

segunda-feira, maio 22, 2006

Encontro

Nada entre nós tem o nome de pressa.
Conhecemo-nos assim, devagar, o cuidado
traçou os seus próprios labirintos. Sobre a pele
é sempre a primeira vez que os gestos acontecem.

Porém, se se abrir uma porta para o verão,
vemos as mesmas coisas - o que fica para além
da planície e da falésia; a ilha, um rebanho,
um barco à espera de partir,
uma palavra que nunca escreveremos. Entre nós

o tempo desenha-se assim, devagar.
Daríamos sempre pelo mais pequeno engano.


Poema escrito por Rosa Lima, e que me foi facultado por uma viciada em poesia.

quinta-feira, maio 18, 2006

In extremis

Nunca morrer assim! Nunca morrer num dia
Assim! de um sol assim!
Tu, desgrenhada e fria,
Fria! postos nos meus os teus olhos molhados,
E apertando nos teus os meus dedos gelados...

E um dia assim! de um sol assim! e assim a esfera
Toda azul, no esplendor do fim da primavera!
Asas, tontas de luz, cortando o firmamento!
Ninhos cantando! Em flor a terra toda! O vento
Despencando os rosais, sacudindo o arvoredo...

E, aqui dentro, o silêncio... E este espanto! e este medo!
Nós dois... e, entre nós dois, implacável e forte,
A arredar-me de ti, cada vez mais, a morte...

Eu, com o frio a crescer no coração, – tão cheio
De ti, até no horror do derradeiro anseio!
Tu, vendo retorcer-se amarguradamente,
A boca que beijava a tua boca ardente,
A boca que foi tua!

E eu morrendo! e eu morrendo
Vendo-te, e vendo o sol, e vendo o céu, e vendo
Tão bela palpitar nos teus olhos, querida,
A delícia da vida! a delícia da vida!

Olavo Bilac

quarta-feira, maio 17, 2006

Quase de nada místico




Não, não deve ser nada este pulsar
de dentro: só um lento desejo
de dançar. E nem deve ter grande
significado este vapor dourado,

e invisível a olhares alheios:
só um pólen a meio, como de abelha
à espera de voar. E não é com certeza
relevante este brilhante aqui:

poeira de diamante que encontrei
pelo verso e por acaso, poema
muito breve e muito raso,
que (aproveitando) trago para ti.


Ana Luísa Amaral

terça-feira, maio 16, 2006

Padre Nosso



Uma solteirona descobre que uma amiga ficou grávida só com uma Avé Maria que rezou na igreja duma aldeia perto.
Uns dias depois foi a essa aldeia e diz a solteirona para o Padre:
- Bom dia Padre.
- Bom dia minha filha. Em que posso ajudar-te?
- Sabe Padre, soube que uma amiga minha veio aqui e ficou grávida só com uma Avé Maria.
- Não minha filha, foi com um Padre Nosso mas já o despedimos

sexta-feira, maio 12, 2006

Sophia

Houve um tempo de heróis, lágrimas e espera,
um tempo de punhais
na noite mais incerta;
houve um tempo de dor,
uma oscilação da alma.

Houve um tempo em que a tua voz se cingiu
à coroa das espadas;
um tempo de sal depositado nos teus lábios;
houve um tempo de cantos, ondas e de estrelas
na branca manhã que o sono nos revela.

E houve um tempo de poemas,
um tempo de palavras,
um tempo (já esquecido)
de música e de festa.

Quem ousará dizer
que os teus heróis regressam,
quem poderá jurar que do amor reaparecem,
ao vento, os perfis das coisas que ele nos deu?


Antonio Mega Ferreira

Havia prometido, e resolvi colocar hj

quinta-feira, maio 11, 2006

Sexólogo :)

Um casal jovem estava desejoso de satisfazer os seus ímpetos entregando os seus corpos um ao outro das formas e nas posições mais variadas.
Porém, a mulher não conseguia obter prazer nenhum. Assim, e após muitas tentativas, e sem obter os resultados desejados, o casal decidiu recorrer aos serviços de um sexólogo. Na primeira consulta, após analisar ambos, o homem perguntou:
- Diga-me, senhor doutor, o que se passa connosco, é grave?
E o sexólogo responde:
- Não, não é grave. Sabe, é que a sua mulher tem uma fantasia sexual muito antiga, e só se realizarem essa fantasia é que ela sentirá prazer durante o acto sexual.
- Mas, e qual é essa fantasia? Diga, diga senhor doutor...
- Bem, ela tem a fantasia de fazer sexo na Roma Antiga, em que os corpos eram refrescados por uma folha de palmeira agitada energicamente por um escravo. Será isso que vocês têm de fazer, arranjar alguém para abanar uma folha de palmeira enquanto fizerem sexo.
- Obrigado, senhor doutor! Iremos seguir o seu conselho.
Então, o casal contratou um preto para abanar a folha de palmeira, e atiraram-se um ao outro, convencidos de que, finalmente, se iriam satisfazer. Experimentaram todas as posições, de frente, por trás, de lado, em cima, em baixo, etc. ... e nada! A mulher continuava a não ter prazer nenhum.
Então o homem desesperou e disse:
- O senhor não se importa de trocar comigo? Eu abano a folha de palmeira e você salta para cima da minha mulher, está bem?
O preto concordou, e saltou para cima da mulher dele. Começaram o acto sexual, e o marido abanava energicamente a folha de palmeira, até que a mulher começou a gemer e a manifestar prazer:
- Umm, que bom! Aaahhhhh, sim, mais rápido, mais rápido! Oooohhhh, Aaaahhhh!
O homem, vendo a sua mulher sentir tanto prazer, gritou:
- Tás a ver, ó preto!?!! É ASSIM QUE SE ABANA A FOLHA!!!

quarta-feira, maio 10, 2006

Sorrio

Sou um espelho onde tu vês
outro vidro com a margem onde corro
tão longe que para ti caminho.

Serás sempre a largueza sem refúgio
que levo comigo.

Por ruas, por luminosos jardins
era a ti que procurava.
Tinha tudo à espera para dar-te
esta escura cerce linguagem
e clara junto dos teus lábios.

Venho de uma noite voltado
para o espaço que me diz
o amor, a cidade comanda-o.
Venho prisioneiro e não estás.

Começo inseguro este descordo,
o ar arde na boca que perdeu a tua.

Sou uma ausência. Um desconvidado.
Uma febre onde o futuro pára. Sorrio.

Joaquim Manuel Magalhães

terça-feira, maio 09, 2006

Poema

Amo-te por sobrancelha, por cabelo, debato-te em
corredores branquíssimos onde se jogam
as fontes de luz,
discuto-te a cada nome, arranco-te com
delicadeza de cicatriz.
Vou-te pondo no cabelo
cinzas de relâmpago
e fitas que dormiam à chuva.
Não quero que tenhas uma forma, que sejas
precisamente o que vem atrás da tua mão.
Porque a água, considera a água e os leões
quando se dissolvem no açúcar da fábula,
e os gestos, essa arquitectura do nada.
Acendendo as lâmpadas a meio do
encontro.
Todas as manhãs és a ardósia em que te invento
te desenho.
Pronto a apagar-te, assim não és, nem tão pouco com
esse cabelo liso, esse sorriso.
Busco a tua soma, a beira da taça onde o
vinho é também a lua e o espelho,
Busco essa linha que faz tremer um homem
numa galeria de museu.
Além disso amo-te, e faz tempo e frio.

Julio Cortázar

segunda-feira, maio 08, 2006

Interrogação

Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;
E apesar disso, crê! nunca pensei num lar
Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.

Por ti nunca chorei nenhum ideal desfeito.
E nunca te escrevi nenhuns versos românticos.
Nem depois de acordar te procurei no leito
Como a esposa sensual do Cântico dos Cânticos.

Se é amar-te não sei. Não sei se te idealizo
A tua cor sadia, o teu sorriso terno...
Mas sinto-me sorrir de ver esse sorriso
Que me penetra bem, como este sol de Inverno.

Passo contigo a tarde e sempre sem receio
Da luz crepuscular, que enerva, que provoca.
Eu não demoro o olhar na curva do teu seio
Nem me lembrei jamais de te beijar na boca.

Eu não sei se é amor. Será talvez começo...
Eu não sei que mudança a minha alma pressente...
Amor não sei se o é, mas sei que te estremeço,
Que adoecia talvez de te saber doente.

Pertence a "Camilo Pessanha", mas bem que poderia ter sido eu....

sexta-feira, maio 05, 2006

P3RC38E? 73N73 L3R



UM D14 D3 V3R40, 3574V4 N4 PR414,
0853RV4ND0 DU45 CR14NC45 8R1NC4ND0 N4
4R314.

3L45 7R484LH4V4M MU170 C0N57RU1ND0 UM
C4573L0 D3 4R314, C0M 70RR35, P4554R3L45 3
P4554G3NS 1N73RN45. QU4ND0 3575V4M QU453
4C484ND0, V310 UM4 0ND4 3 D357RU1U 7UD0,
R3DU21ND0 0 C4573L0 4 UM M0N73 D3 4R314 3
35PUM4.

4CH31 QU3, D3P015 D3 74N70 35F0RC0 3
CU1D4D0, 45 CR14NC45 C41R14M N0 CH0R0,
M45 C0RR3R4M P3L4 PR414, FUG1ND0 D4 4GU4,
R1ND0 D3 M405 D4D45 3 C0M3C4R4M 4
C0N57RU1R 0U7R0 C4573L0. C0MPR33ND1 QU3
H4V14 4PR3ND1D0 UM4 GR4ND3 L1C40:

G4574M05 MU170 73MP0 D4 N0554 V1D4
C0N57RU1ND0 4LGUM4 C0154 3 M415 C3D0 0U
M415 74RD3, UM4 0ND4 P0D3R4 V1R 3 D357RU1R
7UD0 0 QU3 L3V4M05 74N70 73MP0 P4R4 C0N57RU1R.

M45 QU4ND0 1550 4C0N73C3R 50M3N73 4QU3L3
QU3 73M 45 M405 D3 4LGU3M P4R4 53GUR4R,
53R4 C4P42 D3 50RR1R!!

S0 0 QU3 P3RM4N3C3 3 4 4M124D3, 0 4M0R 3 C4R1NH0.

0 R3570 3 F3170 D3 4R314

quinta-feira, maio 04, 2006

As Mulheres estão a ficar espertas

O marido chega a casa e pega a esposa, na cama, com um garotão, 25 anos, forte, bronzeado, cheio de amor pra dar...
Arma a maior barraca, mas a mulher interrompe:
- Você deveria ouvir como tudo aconteceu - diz a mulher.
Na rua, vi este jovem cansado e faminto.
Com pena, eu trouxe-o para casa.
Dei lhe aquela refeição que eu havia preparado ontem, mas você chegou tarde, satisfeito com o tira-gosto do boteco e não comeu.
Ele estava descalço, então dei aquele seu par de sapatos, que, como foi minha mãe que deu, você nunca usou.
Ele estava com sede e eu servi o vinho que estava guardado para aquele sábado que nunca chega, pois num dia é futebol, no outro pescaria.
As calças estavam rasgadas, dei aquele seu jeans em perfeito estado, mas que não cabe mais em você.Como ele estava sujo, aconselhei-o a tomar um banho e fazer a barba.
Depois dei-lhe aquela loção francesa novinha que você nunca usou, porque acha fedorenta.
Daí, quando ele já ia embora, perguntou:
"Dona, tem mais alguma coisa em bom estado e que seu marido não use mais?"
Nem respondi... Dei logo!

terça-feira, maio 02, 2006

Afectos

Fiquei a saber num destes fins-de-tarde
que se podia estar subnutrido de ternura
e afoguei-me no desânimo que me acenava
do horizonte

Caiu-me uma pérola húmida do olhar
pensei apenas em guardar em mim
a saudade das carícias tecidas em silêncio

Não foi possível, acendeste-me o desejo dos teus dedos
apetecia-me beijar-te como quem afaga um charuto
com os lábios vendo subir aos céus o fumo do teu cio

Fiquei a saber numa destas noites de lua cheia
que se podia estar subnutrido de ternura
caiu-me uma pérola húmida do olhar

Apesar dos lobisomens
não se poderem dar ao luxo de cultivar mágoas
nas plantações do estio que passa

Apenas lhes é concedido o grato subterfúgio
de uivar nas trevas como quem urde um poema
às escondidas de Deus

Fiquei a saber numa destas manhãs de trovoada
que o teu corpo era feito de raios e coriscos
e que os teus pais não te deixavam fazer amor sozinha

Por terem medo
dos teus gritos de prazer
na hora de te sentires mulher

Mesmo assim fazias amor sozinha
dispensando-me o teu corpo
em marés de luz

Fiquei a saber numa destas madrugadas de fogo
que a ternura está guardada num baú
disfarçado de cofre à prova de sentimentos

Nessa mesma hora
senti o meu ser
a dissolver-se devagar

Ao longe, muito ao longe
lembro-me de ter sentido um arrepio na alma
como se tivesses pintado o teu sorriso no meu peito


Luís Graça